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quinta-feira, 26 de julho de 2018

Crônicas de um caminhante das Dez Mil dimensões



(...)

E, por isso, começara a carta escrevendo:
Escrevo hoje à vocês porque vaza de mim uma certa indignação com a forma como as coisas aconteceram, e me incomodou a forma como vocês se manifestaram sem eu sequer ter feito convite ou dado abertura para tal.
Peço que se permitam enxergar que esta não é uma carta de rejeição ou julgamento, eu aceito o jeito como são. Isso porque sei por que me acompanham e que há muito vocês foram meus únicos amigos. E, por este carinho que mantive por muito, quero dizer dos atos incorridos, orientar para que procurem um tratamento mais adequado ao que receio ser problema da mais séria gravidade.
Vejam se me faço entender, outro dia - estando eu acompanhado - vocês me fizeram perder completamente a compostura em uma situação muito delicada. 
Como puderam fazer isso comigo? Esta, a pergunta que me ocorria, e não chegava à conclusão alguma, não andava em direção alguma - talvez porque parecia querer andar em todas as direções - é que sem vocês eu ainda não gerava compreensão.
Sem vocês o que existia era só um sonho em devaneio. Eu não conseguia chegar à qualquer conclusão que se pudesse expressar, parece que me permiti tornar tão dependente de vocês que não poderia mais viver no mundo sem depender desta presença que tanto me incomodava.
Peço que me abandonem definitivamente, que não mais se dirijam á mim. Peço que me deixem em paz para ir. Eu mesmo já não quero mais ouvir de vocês. E que seja em definitivo.
E assim, caro leitor, estava determinado à abdicar definitivamente de tudo e ir-se escafedendo por outros espaços e tempos.

Note à que desespero chega um homem. De tanto que perdeu, perdeu-se por completo. Naquele mundo repleto de detalhes inapreensíveis perdera tanto contentamento que resolveu escrever carta  definitiva manifestando-se.

Tudo por não andar tão imensamente distraído. Simplesmente dera ouvidos ao que não deveria. Resultado: impactara-se.

- Gabriel, é preciso estar atento às coisas do mundo.

Agora, palavra adentro pouco poderia ser feito. Desconstruir? Dolorido. Reviver? Impossível.

Não estava suficiente distraído das coisas reais do mundo irreal. Distraía-se com elas e por elas deixara-se comer. Elas, as grandes coisas do mundo. No fim poderia-se concluir que deitara-se com o inimigo que vestia amarelo, pobre!

Escreveu, para o termo derradeiro de sua despedida, em prologo à um soneto póstumo, réquiem à ilusão, lápide velando o que ansiava abdicar:

           com amor,

E, intentando comover à própria mente, em post scriptum, encerrou-se:

           A mente que lhes pensa

Carta escrita, riu-se de si mesmo e de todo paradoxo que representava, mas não esqueceu-se de inventar, antes do ultimo ponto, outra dimensão de sonho, outro espaço-tempo holográfico desenhado em p/b com todas as duas dimensões de cada palavra construindo Mil mundos em Dez Mil dimensões.

Poeta Eterno