Páginas

terça-feira, 17 de abril de 2007

LEMBRANÇA DOS QUINZE ANOS - Álvares de Azevedo

LEMBRANÇA DOS QUINZE ANOS - Álvares de Azevedo



Et pourtant sans plaisir je dépense la vie;
Et souvent quand, pour moi, les heures de la nuit
S’écoulent sans sommeil, sans songes, sans bruit,
Il passe dans mon coeur de brillantes pensées,
D’invincibles désirs, de fougues insensées!
CH. DOVALLE

... Heureux qui, dès les premiers ans,
A senti de son sang, dans ses veines stagnantes,
Couler d’un pas égal les ondes languissantes;
Dont les désirs jamais n’ont troublé la raison;
Pour qui les yeux n’ont point de suave poison.
ANDRÉ CHÉNIER

Nos meus quinze anos eu sofria tanto!
Agora enfim meu padecer descansa...
Minh’alma emudeceu, na noite dela
Adormeceu a pálida esperança!

Já não sinto ambições e se esvaíram
As vagas formas, a visão confusa
De meus dias de amor, nem doces voltam
Os sons aéreos da divina Musa!

Porventura é melhor as brandas fibras
Embotadas sentir nessa dormência...
E viver esta vida... e na modorra
Repousar-se na sombra da existência!

E que noites de sôfrego desejo!
Que pressentir de uma volúpia ardente!
Que noites de esperança e desespero!
E que fogo no sangue incandescente!

Minh’alma juvenil era uma lira
Que ao menor bafejar estremecia...
A triste decepção rompeu-lhe as cordas...
Só vibra num prelúdio d’agonia!

Quanto, quanto sonhei! como velava
Cheio de febre, ansioso de ternuras!
Como era virgem o meu lábio ardente!
A alma tão santa! as emoções tão puras!

Como o peito sedento palpitava
Ao roçar de um vestido, à voz divina
De uma pálida virgem! ao murmúrio
De uns passos de mulher pela campina!

E como t’esperei, anjo dos sonhos,
Ideal de mulher que me sorrias,
E me beijando nesta fronte pálida
A um mundo belo de ilusões me erguias!

O meu peito era um eco de murmúrios...
De delírio vivi como os insanos!
Nos meus quinze anos eu sofria tanto!
Ardi ao fogo dos primeiros anos!

Agora vivo no deserto d’alma...
Um mundo de saudade ali dormita...
Não o quero acordar... oh! não ressurjam
Aquelas sombras na minh’alma aflita!

Mas por que volves os teus olhos negros
Tão langues sobre mim? Ilná, suspiras?
Por que derramas tanto amor nos olhos?
Eu não posso te amar e tu deliras.

Também a aurora tem neblina e sombras,
E há vozes que emudece a desventura,
Há flores em botão que se desfolham,
E a alma também morre prematura.

Repousa no meu peito o meu passado,
Minh’alma adormeceu por um momento...
Sou a flor sem perfume em sol d’inverno...
Uma lousa que encerra? — o esquecimento!...

Não me fales de amor... um teu suspiro
Tantos sonhos no peito me desperta!...
Sinto-me reviver e como outrora
Beijo tremendo uma visão incerta...

Ah! quando as belas esperanças murcham
E o gênio dorme e a vida desencanta,
D’almas estéreis a ironia amarga
E a morte sobre os sonhos se levanta...

Embora fundo o sono do descrido
E o silêncio do peito e seu retiro...
Inda pode inflamar muitos amores
O sussurro de um lânguido suspiro!